“Movimentos sociais e populares, sindicatos, povos, organizações das sociedade civil e
ambientalistas de todo o mundo presentes na Cúpula dos Povos na Rio+20 por
Justiça Social e Ambiental vivenciaram,
nos acampamentos, nas mobilizações massivas, nos debates, a construção
das convergências e alternativas, conscientes de que somos sujeitos de uma
outra relação entre humanos e humanas e entre a humanidade e a natureza,
assumindo o desafio urgente de frear a nova fase de recomposição do capitalismo
e de construir, através de nossas lutas, novos paradigmas de sociedade”, trecho
da Declaração Final Cúpula dos Povos na Rio+20 por Justiça Social e Ambiental -
Em defesa dos bens comuns, contra a mercantilização da vida, realizada entre os
dias 15 a 22 de junho.
Estou cá a escrever sobre o Povo da Cúpula dos Povos. Sei que escrevo um
tiquinho atrasada, mas já me disseram e eu confirmo que: “só escrevo quando dá
na telha”. Isso é fato, coisa de aquariana. Preciso de lua, estímulo.
Vi o Brasil e sua cara, seu jeito, trejeitos, cores e sabores. Vi o
Brasil e o Mundo em suas dores, lutas, dissabores, desigualdade e
tragédias. Me vi em minhas distrações e
atrações, na minha cegueira cotidiana e na sensação de que se pode, ao menos,
protestar. Compartilhei sorrisos, gritos de ordem, dores nas costas, calos nos
pés, barracas, marmitas, experiências e lutas.
Fiquei uns dias sem celular, internet, e etcs, acampada com quase 11 mil
pessoas no Sambódromo do Rio de Janeiro, que não abrigava passistas de escola
de samba, mas movimentos de mulheres, indígenas, negros, agricultores/as familiares e
camponeses, povos de comunidades tradicionais, quilombolas, argentinos,
bolivianos, hippies, juventudes de vários movimentos, religiões de todo o
mundo, mulheres e homens, pessoas conscientes da luta e outras a passeio no
Rio. De tudo um pouco.
Uma convergência total, que jamais vou conseguir expressar em sua
totalidade. Participei de Marchas, mobilizações, ocupações, grupos de discussão
autogestionados, pintei faixas, cartazes, pintei a cara, o corpo e o cabelo. Distribui
comida, organizei fileiras na marchas, pintei lambe-lambes, perdi a voz,
conquistei amigos e experiência de vida.
Digo que mudei a vida, não tão radicalmente como necessito, mas começo a
perceber a mudança que eu quero para mim e para mundo. É pouco? Sim, é! Mas indignar-se
com esse sistema que está aí já é um começo. É como nos disse Chê “Se você é
capaz de se indignar diante de uma injustiça, então somos companheiros”. E
assim digo que encontrei várias companheiras e companheiros.
Estive na rua com 5 mil mulheres e com 80 mil pessoas. E sabe que a
minha mãe queria ver essas ações na televisão para dizer assim “minha filha
está lá”, mas isso não aconteceu né mamãe. Isso não passa na televisão. O que
minha mãe via na televisão eram os problemas no decorrer da Cúpula, pessoas
presas ou desaparecidas, coisas que nem eram verdade. E ela ficava lá perdendo
os cabelos de preocupação. Mãe, no acampamento em que eu estava com mais de 3
mil pessoas, deixava meus pertences ali e ia para rua, nada acontecia, tod@s
eram responsáveis uns pelos outros.
A grande imprensa não se interessa pelas pautas positivas dos Movimentos
Sociais, dos Direitos Humanos. Quando acontece algo de negativo, por exemplo,
são capas e mais capas, manchete e mais manchetes. Ou ainda quando querem
diminuir ou banalizar as ações. Vi essa manchete em um jornal carioca “Dezenas
de mulheres mostram os seios e protestam”
ao invés de “Mais de 5 mil mulheres vão às ruas do Rio protestar”, por
exemplo. Quanto mais puderem diminuir o movimento vão fazer.
Logo, ao contrário do que a grande imprensa pinta, vi um povo
organizado, venci preconceitos. Sim o Movimento Social é organizado, é autogestionável.
Vi isso no acampamento em que estava da Via Campesina, que reuni todos os
movimentos oriundos do campo. Tod@s tínhamos funções e tarefas, participávamos
de equipes de organização dos acampamentos. Eu, por exemplo, era da equipe de
Agitação e Propaganda, assim como outras pessoas da delegação que participavam
das equipes de segurança, alimentação, limpeza, etc.
A cúpula
Quando me perguntavam sobre minha ida ao Rio, sempre se referiam ao
evento da Conferência das Nações Unidas sobre
Desenvolvimento Sustentável (UNCSD), a Rio+20. Afinal, lá em Brejinho de
Nazaré, onde vive minha mãe e minha avó, o monopólio da Rede Globo para quem
não tem antena parabólica, por exemplo, os
chefes de estado passavam na televisão, e assim ficava difícil saber o
que “cruzes” era a tal Cúpula dos Povos.
Logo, eu pulava lá atrás e corrigia
“Non Non, não estava na Rio +ou- 20, eu estava na Cúpula dos Povos, por
Justiça Social e Ambiental, um evento paralelo que reunia o povo, organizado
pela sociedade civil global” .
Nós tínhamos pautas para debater e bandeiras para defender. O papo de
economia verde não desce e não desceu. Como disse Marina Silva “não é importa a
cor da economia”. Sim a cor da economia não importa, o que é importa são as
soluções.
Nossas plenárias foram pautadas por eixos sérios e comprometidos com
aquilo em que os movimentos acreditavam.
... Na Plenária 01, que discuti direitos, foram debatidos e agendados
ações anti-militarização; por igualdade de gênero dentro das organizações; por
liberalização das drogas; contra a criminalização da juventude; por
solidariedade com Cuba e Haiti; contra a privatização das sementes. Na Plenária
02, referente à defesa dos bens comuns e contra a mercantilização, envolveu a
campanha pela reforma agrária; pela comunicação como bem comum e pela liberdade
de expressão. Na a Plenária 03, que tratava da soberania alimentar, foi
elaborado, por exemplo, campanhas pela
produção e consumo de alimentos sustentáveis, contra o uso de agrotóxicos e de
transgênicos, pela produção de sementes crioulas. Na Plenária 04, em relação à energia e indústrias extrativas, a
Cúpula dos Povos programou campanhas contra o abuso das corporações
transnacionais, e pela denúncia de empresas causadores de degradação ambiental
e de violação de direitos. A quinta e última Plenária, que tratou de trabalho e
economia, construiu campanhas contra o capitalismo e formas de exploração do
trabalho, pelos direitos dos trabalhadores e pela reforma do sistema político
brasileiros” (trecho retirado do Site da Cúpula).
Referente ao evento “oficial” da Rio +20, nós não vimos avanço. O
resultado foi um documento superficial, poucos países comprometidos! Chefes de
estado fazendo pouco caso e representatividade nula do povo. Quais avanços a Rio +ou - 20 trouxe para a
transformação social que esperamos do mundo e a emancipação do povo? Economia
verde? Isso nem chega a ser solução para a crise financeira que o mundo
enfrenta, quiçá para a crise global anunciada e vivenciada pelos povos.
Os
resultados
Aqueles dias foram momentos de muito aprendizado, marcaram minha vida. Um
espaço para o povo, ali representado pelos movimentos sociais, organizações, coletivos, expor, praticar e dialogar com a sociedade
sobre suas experiências e projetos.
A Cúpula nos
mostrou, por meio do acúmulo histórico dos vários movimentos ali representados,
que as lutas locais são globais. As lutas das mulheres, por exemplo, são de
todas as mulheres e de toda a sociedade, as quais tiveram grande
representatividade na Cúpula e espaço para debate e construção de agendas. “Afirmamos o feminismo como instrumento da
construção da igualdade, a autonomia das mulheres sobre seus corpos e
sexualidade e o direito a uma vida livre
de violência”, diz o trecho da Declaração Final da Cúpula.
Tivemos uma oportunidade única para tratarmos, enquanto sociedade civil
organizada, dos graves problemas enfrentados pela humanidade e demonstrar a
força política dos povos organizados. A cúpula não acabou no dia 22 de junho e
não acaba, quero tudo de novo, aquele povo, aquela juventude... Agora é
conosco. Preciso continuar, precisamos continuar, nos nossos coletivos,
movimentos, organizações... a tarefa é
nossa. Nossos desafios são grandes e continuam.
Protestei nas ruas do Rio de Janeiro, com 5 mil mulheres e com 80 mil
pessoas, anônima como muit@s, mas consciente da responsabilidade que temos
enquanto protagonistas desse processo. “Por um projeto feminista e popular”,
por isso, “de pé, continuamos a luta”.
Clique aqui e leia na íntegra o Declaração Final Cúpula dos Povos na
Rio+20 por Justiça Social e Ambiental.
Rose
Dayanne Santana – Cidadã Brasileira, Jornalista e Militante dos Movimentos
Sociais de Juventude, Mulheres e Meio Ambiente.
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